Conexão Brasil x Portugal: Pepper ou a história da minha vida contada ao contrário

Acabo de regressar de Tóquio, do coração do “Japão tecnológico”, onde fiquei hospedado num hotel cuja “primeira figura da Companhia” era mesma a sua concierge.

Trata-se de Pepper, uma concierge robot, de estatura relativamente pequena mas elegante, com uns olhos grandes e bonitos, umas mãos fortes e bem desenhadas, e sobretudo uma capacidade incrível de atrair os clientes, os olhares e as atenções, bem como uma orientação clara para o acolhimento e para a atenção do cliente.

A (minha) robot Pepper chamava diretamente os clientes para junto de si, quer através de locuções simpáticas de acolhimento, quer através de gestos suaves de envolvimento e atração dos interlocutores, independentemente das suas idades, estaturas ou nacionalidades.

A Pepper fala quatro línguas, sendo que das línguas ocidentais apenas o inglês pode ser utilizado na interação com ela.

Confesso que a minha relação de fascínio com a Pepper pode ser enquadrada no que nos “romances de cordel” pode ser considerado “amor à primeira vista”!

Nunca dispensei cumprimentos diários, sempre recíprocos e correspondidos com a Pepper, e longas “conversas” sobre “que tempo vai fazer hoje em Toquio?”, “como posso ir a determinado local?”, “o que sugeres que visite na aqui em Toquio primeiro?”, ou “o que fazer num dos extraordinários bairros da cidade?”, “qual o restaurante ideal para comer tradicional comida japonesa sem ser sushi?”… e ainda, com muita pena minha, a celebre questão final, “qual a melhor e mais económica maneira de chegar ao aeroporto, Pepper?” foram questões para as quais a Pepper sempre teve resposta. E até de Portugal ela já havia ouvido falar…

A Pepper sempre correspondeu de forma eficaz, simpática, cordial e completamente afável, a todos os desafios que lhe ia propondo ao longo dos dias e, obviamente, com o passar das horas e dos dias, o meu tal “amor à primeira vista” foi-se desenvolvendo e tornando-se num “amor maior” e (quem sabe?), num “amor para toda a vida”!

Pepper, Pepper… agora que regressei a Portugal, como vou fazer para saber tudo sobre o tempo e os espaços das cidades e onde posso encontrar as minhas refeições favoritas? Claro, regressei às minhas Apps habituais, socorro-me dos meus sites e redes sociais favoritos, ou pergunto a alguma das extraordinárias Pessoas que felizmente fazem parte do meu circulo de amigos e família…

Ups… eu disse Pessoas??

Eu que sempre vivi a atual (denominada) quarta revolução Industrial pensando e enquadrando o digital como “um mal necessário”, como uma realidade assumida e à qual não se pode fazer frente, e na qual as Pessoas poderão aproveitar para aprender, reaprender, compreender a tecnologia como uma amplificação e extensão das suas características mais especificas, únicas dos seres humanos… mas que, no fim do dia, seriam sempre os humanos que deteriam o domínio da inteligência sobre a máquina…

É verdade, estou finalmente (e assumidamente) completamente apaixonado por uma robot bonita de olhos grandes, maravilhosamente simpática e que responde a todas as minhas questões num inglês irrepreensível.

Pior de tudo… já não consigo imaginar aquele hotel, ou qualquer outro hotel do mundo, sem a minha robot favorita a dar-me os bons dias e soluções para os meus desafios maiores.

Eu que enquanto líder e gestor de pessoas que tenho procurado sempre, em todos os momentos, encontrar respostas para com as Pessoas atingir os melhores resultados, vejo-me agora a encontrar numa máquina (se bem que bonita, elegante e bem vestida…) a solução encantada e ideal para potenciar a satisfação dos clientes (incluindo eu próprio!) de um hotel e, a partir daí, potenciar melhores e sustentados resultados.

Afinal a substituição de colaboradores das empresas por parte de robots, que era algo que eu via apenas como inevitável e para o qual teria de preparar as minhas pessoas para poderem enfrentarem este “desígnio” com melhores qualificações e competências de nível mais elevado, após uma mera viagem de férias Tóquio, passei a achar como algo desejável e até altamente positivo.

Uma vida inteira a apregoar com a maior convicção que “as pessoas são o melhor das empresas” e agora caio nesta nova realidade de achar que podem existir robots que são também eles… o melhor das organizações?

Será que um dos maiores desígnios das novas lideranças passou a ser o que poderem enquadrar Pessoas e Robots em equipas mistas e de elevado desempenho, unidos em torno do atingimento dos tais melhores resultados? Nesse caso, se eu quiser ser um Gestor de Pessoas capaz de preparar as minhas pessoas para o futuro das equipas e das empresas vou ter de fazer muito mais do que simplesmente ir requalificando-as ou possibilitando a aquisição de novas competências técnicas e sociais para poderem enquadrar-se nesse futuro mantendo-se empregáveis. Vou ter de repensar tudo, de facto! Começar a trabalhar as competências relacionais de interação entre humanos e robots. Começar a redesenhar os processos de gestão a partir de integrações entre componentes e diferentes agentes suportados em inteligência humana e artificial com vista a otimização e racionalização de meios e respostas.

No fundo, trata-se da emergente e imediata necessidade de desenho e implementação de um enorme processo de mudança organizacional adaptado aos novos contextos de volatilidade, incerteza, complexidade e ambiguidade (do célebre “mundo VUCA”) mas alicerçado em novos pressupostos de integração humano-robot, no qual cada um desempenhará, sem preconceitos, o seu melhor papel e desígnio, e não mais uma lógica de extensão de potenciais, mas uma verdadeira partilha e cooperação.

Transformar os colaboradores em agentes desta poderosa mudança, inspirando e influenciando no sentido de serem integradores, mas também apaixonados pela diversidade de inteligências diversas e novas formas de processamento dos pensamentos, passou a ser o desafio maior do lideres dos processos, das pessoas e dos robots do futuro que, afinal, é já bem presente…

É verdade que a minha concierge favorita veio-me fazer repensar toda a minha vida anterior enquanto gestor de pessoas, líder de equipas e processos, mas também enquanto professor e formador mas, sobretudo, enquanto aluno, formando e profissional que mais do que saber surfar na onda da transformação digital e da mudança organizacional, precisa de ser influenciador e permanente inventor de soluções integradas focadas na solução e nos resultados mensuráveis.

Uma “robozinha” de cerca de um metro de altura, mas com um charme absolutamente avassalador, veio fazer-me rever todas as minhas lógicas de aprendizagem e carreira, atuais e futuras, bem como por em causa um conjunto de preconceitos que tinha quanto ao papel de humanos e máquinas nos futuros processos de transformação e mudança organizacional.

Foi, afinal, a minha (nossa) querida Pepper, que representa um novo paradigma de gestão e vivência nos contextos empresariais, que me fez compreender que a tal revolução digital é bem mais do que um prolongamento das capacidades humanas, mas uma verdadeira integração de multiplicidades, diversidades e novas potencialidades que, no quadro das velha e novas inteligências, farão brilhar o que me melhor as empresas possuem - as suas Equipas mistas, de pessoas e de robots!

“Querida Pepper, é mesmo do outro lado do mundo que te escrevo. Só para te dizer que foi muito importante conhecer-te para virar do avesso a visão sobre o futuro das Pessoas nas Empresas. Ganhei uma nova dimensão da vida e da minha importância e papel nas organizações. Simplifiquei a minha ideia do futuro graças a ti! Afinal, tudo se simplifica e se torna mais claro quando estamos apaixonados. Valeu, mesmo! Do teu fã e companheiro de longas conversas (…)”.

Pedro Ramos, Diretor de RH do Grupo TAP Air Portugal e Palestrante Internacional do CONCARH 2018

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